domingo, 31 de janeiro de 2010

Poor child

Hoje passei numa livraria e estava tão lotada, mas tão lotada, que fazia o Piscinão de Ramos parecer a Colina da Solidão. Mataram a charada por mim: volta às aulas.

Muito bem. Mas por que deixar para a última hora a compra dos benditos materiais de seus pimpolhos e atravancar todo o caminho dos pobres passantes? Não sei. Mas também não me interessa saber do relapso desses pais, o que achei engraçado é que imaginei, por puro exercício de tédio, o que ocasionaria a concretização de uma vingança mesquinha por mim idealizada e pelo destino executada (ó, poeta).

Pensemos: a criança compra alguns lápis (palavrinha sem plural!) e um apontador. Na aula, amanhã, ele vai apontar um para escrever o ditado da professora — já que ele comprou apenas hoje o material e não teve tempo de fazer outra coisa que não arrumar a mala e cogitar quais fofocas dividirá com os colegas —; vai escrever e quebra a ponta. Vai apontar mais uma vez mas derruba o lápis. Pega-o de volta e aponta repetidas vezes, todas sem sucesso, já que na queda o lápis quebrou o grafite interno. Então a criança percebe que perdeu um baita tempo e o ditado acabou. Ela é a única criança na sala que perdeu o ditado e não teve o ponto. Leva bronca da professora. Seu rendimento cai, ele se desanima, pega recuperação, repete o ano após meses de angústia. Acaba tendo de mudar de escola, vai para uma mais barata, tenta a bolsa e não consegue, não faz amigos, fica retraído, tem depressão, cada vez mais se perde no abismo de seus problemas. Seus pais não sabem o que fazer, tiram-no da escola.

Daí pra frente é basicamente só desgraça, até o suicídio ou ser morto por mendigos num beco.

Às vezes as coisas saem de controle, mas por sorte eu não tenho poderes sobre as vidas alheias (porque a imaginação às vezes é algo destrutivo).

sábado, 30 de janeiro de 2010

Cicerone

Meus lugares favoritos em São Paulo (ou "Se eu não estiver aí no meu tempo livre o mais provável é que eu esteja em casa"):

1. Cinemateca - Meu cinema favorito. Ambiente extremamente agradável, perto da minha casa (vinte minutos a pé, o que é bom também para fazer um sedentário como eu caminhar), boas salas, excelente programação, poder rever em película filmes que eu adoro, conhecer obras obscuras... Sem contar que o ingresso é barato, o que é muito importante para um mão-de-vaca como eu. E nem falei da biblioteca deles, que é uma beleza; já fiquei ilhado lá numa chuva enquanto esperava um filme começar, nem senti o tempo passar.

2. Avenida Paulista - Andar por suas ruas cinzentas e de gente apressada, por suas paralelas e transversais (Alameda Santos, Augusta, Rua da Consolação...), freqüentar seus cinemas, suas livrarias abarrotadas de livros de todos os países e espécies, conhecer lojas e prédios que nunca havia percebido mas que estavam sempre lá, matar tempo, caminhar da Consolação até minha casa numa tarde qualquer.

3. SESC Vila Mariana - É praticamente do lado da minha casa. Já perdi a conta de shows que vi por lá apenas pela facilidade de aparecer lá, de artistas para os quais não ligo muito. Sempre tem um concerto bacana, uma exposição legal, fora que também é muito gostoso passar por lá como quem não quer nada, ou ler a seleção de gibis na sala de estudos, tardes inteiras sentado lendo Will Eisner ou Robert Crumb. Ver o povo nadar, ir na lanchonete acompanhar alguém (dificilmente como algo fora de casa), subir pela rampa da entrada e descer pela escada lateral, conferir afoito nos primeiros dias do mês quais apresentações haverá nos próximos dias...

4. Centro Cultural São Paulo - Também é perto da minha casa (não me divirto em lugares longe, fico aflito com o tempo de retorno), e tenho tantas recordações, ir lá com amigos, com minha mãe, sozinho... Aquela Gibiteca, de que conheço vários segredos ocultos a todos que não foram iniciados na magia dos quadrinhófilos, a biblioteca cheia de tantos milhares de livros variados (quantas coisas inesperadas naquele bolo todo!), subir nas áreas descampadas, passear pela parte fechada, os jogadores de RPG sempre em suas mesas, no outro canto os xadrezistas quebrando a cabeça...

5. Imediações da minha casa - Uma delícia vagar sem rumo e horário por essas ruas que eu conheço já tão bem, fazendo caminhos esquisitos que ao invés de atalhar aumentam ainda mais o percurso, imaginar mapas na cabeça, passar em frente à minha saudosa escola (de que sinto uma tremenda saudade), ao meu curso de francês, ir por todos os caminhos das ramificações do meu bairro e do que há a seu redor.

Lugares que perderam um pouco da (ou toda) graça:

1. Centro Cultural do Brasil - Não vou lá desde dezembro de 2007, quando conheci Alejandro Jodorowsky. Não é o pior lugar do mundo, mas tem vários inconvenientes: além de ser chato ter que se deslocar até a Sé, ultimamente tinha que comprar os ingressos pro cinema com cerca de uma hora de antecedência, o que é um baita desperdício de tempo (e várias foram as vezes que os ingressos estavam esgotados, porque há uma legião de desocupados que moram lá perto e sugam tudo que podem pelo simples prazer de aborrecer); sair de lá à noite é um exercício de fé, com seus cheiradores de cola entocaiados nos becos escuros, o forte cheiro de urina do caminho, os bêbados remanescentes de sempre; de manhã e tarde lá é tão cheio de punguistas, malandros e camelôs que só sendo nadador olímpico para se desviar com sucesso; domingos lá é uma desolação tão plena que chega a dar medo; e, at last but not at least, o frequentador mais assíduo do lugar era um velho insuportável, que ria como uma hiena desdentada em cada segundo dos filmes, e também aparecia em outros eventos para encher o pacová. Esse senhor me fez perder a vontade de voltar lá antes que ele desapareça do recinto. Sujeito mesmo insuportável, de estragar o dia de qualquer um que não tenha sangue de barata. Pergunta dele numa concorridíssima palestra do Jodorowsky: "Cantinflas era un maricón?".

2. HSBC Belas Artes - Ainda é o cinema comercial que mais freqüento (para falar a verdade, quase sempre vou nele), por ter a programação que mais me interessa e não ser tão caro. É super fácil chegar lá, mas tem vários problemas que me desagradam: as atendentes do caixa têm sempre cara de poucos amigos, nunca vi mulheres menos simpáticas; as sessões do Cineclube sempre fazem o público ficar esperando no corredor, os funcionários abrem a sala faltando no máximo uns sete minutos; eles PASSAM TRAILERS nos filmes do Cineclube, nunca vi isso; o cinema incentiva aquela maldita associação com pipoca, então sempre tem alguém empesteando a sala com o fedor dessa desgraça e irritando com o barulho da mastigação (e eles comem pipoca SEMPRE, não interessa se é um drama de guerra iraniano ou uma comédia musical romena).

Obs.: Os números não representam necessária ordenação interna.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

O homem que amava as mulheres

Estou lendo uma biografia do Truffaut e eis que me deparo com isto:

Rubis resplandecentes, eu não vos amo
Pois brilhais com um ardor discreto demais
Prefiro de dois seios a tepidez imoral
Seios duros, seios quentes e armados, de veias azuis, tão pálidas.

Na eterna prisão, entramos sem bater
E chupamos até morrer os encantos da moça
Narciso tateia na água, Ofélia segura os ramos
Descarregamos e nos apagamos num sutil recuo.


No despertar de seus primeiros amores físicos o jovem François comunicava seus feitos ao grande amigo Robert Lachenay por meio de poemas inspirados em trechos literários. E não é só:

Eu queria que seu vestido me cobrisse
Por meus lábios sua calcinha fresca seria umedecida
E meus braços, enlaçando-me sob seus joelhos, dobrariam
Suas coxas ebúrneas e deslizariam por suas meias.


Um doce mais doce que o doce de batata doce para quem me achar os originais desses versos.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Crueldade Mexican style

Eu ODEIO a Dona Florinda.

Hoje no almoço ligaram no Chaves na televisão da sala aqui de casa, e vi pela 198728763ª vez aquele episódio dos algodões-doce X terra/moedas. A velha miserável mãe do Quico — que também é bem sonso — espancou o pobre do Seu Madruga por conta de uma idiotice qualquer inventada na hora, mas com uma TAL fúria que o sujeito ficou todo quebrado, olho roxo, precisou se locomover com muletas, gemia a cada passo, cheio de talas, faixas, hematomas.

Isso NÃO é engraçado. Isso é desumano, cruel, em mim causa até nervoso, irritação, fico cada vez com mais raiva da maldita Dona Florinda, pessoa detestável, amontoado de qualidades negativas, violenta, covarde, injusta, cruel.

No final do episódio ainda teve o Chaves e o Quico sendo abomináveis também, plantando a Chiquinha com terra até os tornozelos e a molhando, humilhando-a a pretexto de nada, por uma vingancinha reles.

Não sei se estou ficando muito bobão, mas cenas assim não me divertem, só me deixam fulo.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Pointless

Ontem apareceu neste blogue um usuário chamado Jimmy, que postou comentários a respeito de um post que ele considerou estúpido.

Até aí nada demais, o problema é que o sujeito em questão se acha no direito de apontar o que ele acha errado no que eu penso ou no que eu digo. E claro que de uma maneira estapafúrdia. Ficar procurando ERROS em opiniões bobinhas de blogue, como se fosse uma tese científica que precisasse ser revisada, além de deselegante é extremamente irritante. Não tenho nada contra quem discorda de mim, mas claro que detesto coisas tipo: "não, você está errado; a verdade é que...", com esse arrogante tom professoral.

E aí, claro, se a gente responde com ironia a essa provocação ridícula, pela simples falta de vontade de discutir algo que já sabemos que o "oponente" considera ganho, somos tachados de mimados, covardes etc.

A última gracinha do tal Jimmy foi:

Eu vim duma educação extremamente nerd onde discutir = viver. E eu vou continuar lendo seu blog (ou não), e vou continuar apontando seus erros (e não os errinhos bobos, mas os erros ideológicos), e eu vou continuar lhe ENCHENDO o saco, se você continuar escrevendo coisas ERRADAS. E quando você escrever coisas LEGAIS eu venho aqui e digo LEGAL, porque assim que funciona a internet (heh, acabei de guia mesmo): você não pode controlar quem lê seu blog (até pode, mas é meio pointless), e você tem que aprender a viver com isso.

O que há de mal em dizer algo do tipo "Oi, você está errado e isso que disse é estúpido"? Não entendi. É a coisa mais saudável e natural, principalmente entre duas pessoas que zelam pelo progresso intelectual (próprio ou coletivo).


Obrigado, rapaz. Mas eu NÃO preciso de alguém que APONTE quando erro e quando acerto, como se isso não fosse cretino. Ficar julgando O QUE EU PENSO e O QUE EU DIGO, e dando estrelinha pra atestar quando digo algo que passou pelo crivo. Por que não é humilde e discute numa boa, sem querer provar que quem discorda de você "está errado"? Vontade de aparecer, acredito.

Eu pensei em excluir todas as postagens desse usuário, mas não quero ser despótico, dar esse gosto a ele. Estão aí, para todo mundo ver. Mas eu não vou mais responder. Pode estrebuchar, Jimmy.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Para a morte não há remédio

Vi uma receita para um remédio (?) contra acne prescrito pelo ex-dermatologista de um parente — o "ex" é claro que é pelo absurdo que ele receitou. Um medicamento que causa inchaço momentâneo, leve sonolência ou coisas do tipo já é algo que incomoda, então o que dizer de algo que pode alterar seu humor, causar surtos de agressividade e até provocar vontade de suicídio?! E, repito, ISSO É UM REMÉDIO PRA ACNE. Eu não tenho a pele boa, ela é muito oleosa, tenho várias marcas de espinhas etc., mas nem se fosse pra evitar ficar como o Lúcio Mauro eu usaria algo assim. Acho menos ridículo que criminoso passar uma medicação assim, pelo menos para um motivo tão estúpido como tratar de espinhas.

Eu tenho verdadeiro pavor de remédios, evito ao máximo ficar doente para não usar essas coisas que alteram tudo sem permissão. A única coisa que tomo é, uma vez por dia, um comprimido para o hipertireoidismo; contra minha contade, aliás: se puder um dia parar eu o farei sem hesitar.

Eu evito até tomar aspirina, acho que nunca tomei uma na vida. Tento não ter dores de cabeça, e se as tenho eu sento, durmo, paro, espero passar. Remédios em mim não entrarão enquanto eu puder impedir. Quando fico doente imagino que estou são, isso impede o desenvolvimento de novos problemas, raramente tomo alguma coisa receitada.

Não fumo, não bebo e não incorro em muitos excessos, já está de bom tamanho para a minha saúde.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Bricolando

Regras sobre consertos/instalações:

1. O material é sempre caro.

2. Nunca tem o material que eu preciso.

3. Sempre que compro algo achando que vai prestar dá algum problema.

4. Meu pai sempre acha que pode arrumar tudo.

5. Meu pai gosta de "dar jeitinhos".

6. Eu me desespero com as situações dos itens 4 e 5.

7. Se a caixa do produto diz que é super fácil de montar é porque o manual de instruções vai contradizer.

8. Se eu não soubesse inglês ou francês não iria entender as instruções.

9. Suportes para televisão e outros itens caseiros deveriam ser práticos para qualquer pessoa montar sozinha em seu lar.

10. Nunca nada fica do jeito que está na foto da caixa.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Chove chuva

Eu adoro chuva. Adoro o frescor da água, o cheiro das coisas molhadas, o barulho da chuva na janela à noite. Mas a chuva causa tanta destruição que é quase uma obrigação cívica detestá-la.

Eu não. Continuarei gostando dela. Sei que pareço egoísta, porque moro em um bom lar, sem perigo de desabamento ou inundação. Mas eu não tenho culpa se a cidade está um caos, se o prefeito é um incompetente — além de falar igual ao Patolino —, se os barracos amontoados nos morros desabam ao menor espirro sobre eles.

Eu me compadeço dessas pessoas, mas não tenho culpa dos problemas de estruturação arquitetônica das áreas marginalizadas e mal urbanizadas da cidade. Eu respeito meus deveres como cidadão e levo uma vida tranqüila sem incomodar muita gente. Eu adoro SIM que desabe o mundo quando estou em casa, não sei se é um prazer inconseqüente de criança mimada mas é algo que me apaixona e agrada, com todo o respeito àqueles para quem a água só traz destruição e morte.

Não posso fingir não gostar de chuva porque ela causa prejuízo a tanta gente, ou então chegaremos ao ponto de dizer que não gostamos de beijos porque quem tem hanseníase não os sente, coitados.

A vida é muito curta para que vivamos as dores dos outros.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Notas sobre a escrita

1) Adoro minha letra cursiva. Queria muito conhecer um grafólogo ou estudar grafologia. Acho que aprenderia mais sobre mim analisando meus garranchos do que em anos de terapia.

2) Odeio escrever à mão por muito tempo, principalmente na faculdade. Meu dedo médio direito tem um calo horrível, acho muito feio quando o forço (e o forço, para escrever) e ele fica inchado, irritado, vermelho (vermelho é a cor dos grandes horrores).

3) A imagem que escolhi e tratei para este blogue é Sandrine Bonnaire em Monsieur Hire, não só porque adoro o filme e acho a Sandrine linda — ainda mais de cabelos louros compridos e perna de fora —, mas porque ela está escrevendo. Coloquei o título do blogue em uma letra que imita uma grafia cursiva (e em aspas) para parecer que ela está escrevendo uma espécie de diário. Confesso que fiquei orgulhoso do meu trabalho, achei muito bonita e sugestiva a foto.

4) Os primeiros contos que escrevi são horrorosos. Gosto dos mais novos, mas parei de escrevê-los porque não via como publicá-los e penso que ninguém se interessa por eles; só quero voltar a escrever quando tiver perspectivas de publicação. Não cogito colocá-los neste espaço.

5) Entre textos sobre cinema, homenagens a artistas que admiro, críticas de obras artísticas de diversas mídias (quadrinhos, filmes, livros etc.), penso já ter escrito mais de uma centena de páginas, ou talvez até bem mais. Também gostaria de publicar esse material, mas acho que deve ser ainda mais difícil que com minha produção literária.

6) Alguém conhece um leitor profissional (aqueles caras que as editoras contratam para examinar os originais promissores)?

domingo, 17 de janeiro de 2010

A cor da vergonha

Desde que me entendo por gente sou tímido. Em filmes e em seriados, as mulheres acham timidez uma graça, adoram homens tímidos, apaixonam-se no ato.

Mas isso não acontece. Se o homem não toma iniciativa, a mulher nunca vai se mexer. Sei por experiência própria. De nada adianta ser apresentável, ser educado, ter planos de uma boa relação, mirar nos olhos da pessoa e a informar de seu interesse; nada disso servirá na hora fatal, a do tiro no coração: é preciso o contato verbal, justo o que falta aos tímidos.

As pernas bambas, o coração acelerado (e o medo de morrer antes dos 30?), a boca seca, os olhos nervosos, os suores, a preocupação. Tudo isso só piora ainda mais as coisas, passa a imagem de inexperiência, covardia, qualidades negativas que as mulheres identificam de imediato. A timidez é isso. Ela não é uma graça, mas seu oposto; possuí-la é o mesmo que ser condenado a vagar solitário até conseguir deixar de ser você mesmo e tomar a iniciativa, adiantar-se; o que nunca vai acontecer. E quando acontece é uma pálida compensação do que poderia ser sem o sentimento nefasto de pensar que suas palavras fogem e que você sempre se expressa aquém do que sente.

E não só em casos sentimentais; timidez arruína entrevistas de emprego, por exemplo. Recentemente passei por algo desse tipo, concorrendo ao tal Curso Abril de Jornalismo. Passei fácil pela fase escrita, fui chamado para a entrevista e lá fui. Na hora, me atrapalho, percebo que nada tenho a dizer, se o digo é algo dispensável e, portanto, me condeno. Destruo qualquer esperança quando a ilusão mostra-se inalcançável. Esse curso em si de fato não parecia grande coisa, mas tenho certeza de que não me sairia melhor em qualquer oportunidade mais importante. E quem disse que o mérito profissional é o primeiro item a ser analisado? Claro que eles querem uma pessoa expansiva, um showman, desenvolto e com "jogo de cintura". Eu não presto pra isso.

Pelo menos venho me esforçando para corar cada vez menos. Isso sempre me incomodou muito.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Infância

Hoje retornei ao Parque da Mônica, ao qual não ia há uns bons doze anos. É muito tempo. Eu precisava fazer essa viagem de volta ao meu passado, se não hoje ao menos em um outro dia próximo: o parque foi despejado e não mais permanecerá em seu clássico espaço no Shopping Eldorado.

Fui, não sei, duas ou três vezes quando pequeno. E eu adorava. Hoje não ligo mais muito pra Mônica — sempre bandeado para a Disney —, mas não havia como não resgatar as lembranças da infância, lembrar os lugares por onde passei, os pequenos detalhes que me emocionavam e que hoje ainda estão intocados: a Casa do Louco, por exemplo, continuo achando engraçadíssima, e a da Mônica, aborrecidíssima.

A surpresa foi que os brinquedos continuam rigorosamente os mesmos, as ambientações, espaços e até a aparelhagem permanecem como estavam em minha memória. O que não é necessariamente uma coisa positiva: os computadores com jogos para serem acionados ao toque dos dedos não funcionavam direito, de tão gastos e surrados, as cores invertidas na tela, vários monitores simplesmente quebrados.

Fiquei pouco menos de duas horas. Comi um pastel, vi o teatrinho dos personagens do velho Mauricio de Souza, vi a Mônica, Cebolinha, Cascão, Magali, Anjinho, Franjinha, aquela japonesinha criada há poucos anos (vá se saber seu nome) e aquele menino que fica numa cadeira de rodas (também não sei como se chama), comprei quatro chaveiros de recordação, vou guardar essas coisas e mais a entrada e o saquinho de compra como recordações de um período da minha vida que nunca poderá ser igualado.

Lembro que quando era pivete voltava do Parque da Mônica e achava minha casa vazia, pouco atraente, sem emoção. Eu gostei de me sentir um pouco assim também hoje.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Verdugo

Estou, acredito, no terço final do meu Trabalho de Graduação Interdisciplinar (TGI — nada mais do que o famoso TCC, que na minha faculdade tem esse outro nome). 43 páginas até o momento, sendo o máximo 60; pretendo ir até umas 52, 53 páginas.

Bem, já ouvi muita gente falando que um dos méritos das universidades é incentivar a pesquisa e os trabalhos acadêmicos, e sempre me irrito com essa besteira. A minha faculdade não incentiva porra nenhuma, eu simplesmente estou fazendo o trabalho porque sou obrigado, é uma matéria fixa e se eu não a fizer não posso concluir o curso e me formar.

Durante essas quatro dezenas de páginas eu fiz mais citações do que o Almodóvar faz em seus filmes (e tão mal quanto); não li nenhum dos livros, mas simplesmente fui coletando em alguns certas frases, conceitos e explicações que interessavam ao meu trabalho. Ou seja, engrandecimento intelectual ZERO. Não me orgulho desse sistema de "transporte", mas também não posso me envergonhar: sou um estudante de 22 anos que não tem qualquer opinião sobre essas matérias específicas e que não pode evidentemente se pronunciar com embasamento sobre elas.

Eu não ligo a mínima para o tema do meu trabalho, e não haveria como fazer nada diferente; se eu trocasse de assunto e escolhesse falar de algo que realmente me interessa, não encontraria orientador (pois é obrigatório ser "orientado") e também teria dificuldades com os materiais publicados, as fontes e livros em que procurar ajuda.

No final das contas, é aquela velha história: eles fingem que ensinam e eu finjo que fico satisfeito. Mas como não gosto de mentir finjo muito mal: me enraiveço, tremo de raiva de me saber impotente frente a essa burocracia negligente da minha digníssima e conceituada faculdade. Essa questão do TGI é apenas um dos meus infindáveis e inumeráveis atritos com a instituição de ensino — e, por sinal, nem é dos que mais me enervam.

O que me consola palidamente é meu orgulho bobo de bicho ferido que sabe que vai morrer mas não ruge, para deixar o caçador na tensa espera; não falo nunca sobre o meu curso, não demonstro qualquer inexistente orgulho pela faculdade em que estou e não encho a boca para falar dos benefícios das universidades. Só apresento a carteirinha para obter desconto no cinema.

Não tenho qualquer motivação para fazer publicidade para meu carrasco.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Náufrago

Eric Rohmer morreu faz três dias. Eu não quis comentar nada neste blogue porque achei que seria muito cômodo louvar o homem na ocasião de sua morte. Mas o fato é que fiquei chateado com sua morte, não a ponto de chorar (como minha mãe acredita), mas mais por saber que não teremos mais nada inédito dele, que sua obra imortal vai ficar rígida como a coleção de Balzac numa biblioteca.

Não me espanta tanto assim saber que um homem morreu próximo aos noventa anos, mas como podemos nos importar tanto e ser tão influenciados por gente que nem ao menos sabe de nossa existência. Eu posso fechar a cara ao avistar um colega inconveniente na rua ou fugir por uma esquina para não ter de cumprimentar um ex-professor, mas Eric Rohmer estará para sempre comigo, como um dos meus mais distintos heróis. Já passei há muito tempo da fase de me chocar com o inescapável fato de que me importo mais com meus escritores, meus diretores, meus músicos, meus artistas que com meus parentes que não moram comigo, com meus tios, meus primos. Criamos laços que não são de sangue, são muito mais fortes.

Eric Rohmer ainda é pra mim uma das minhas ilhas de refúgio.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Pânico

OK, eu sei que o público da Ivete Sangalo provavelmente nem sabe fazer os cálculos matemáticos mais elementares sem utilizar os dedos das mãos, mas que espécie de ser humano incrivelmente tapado pode ignorar que nessas seguintes fotos a modelo NÃO é a Ivetão, mas uma criatura encharcada de photoshop até o último pêlo de sua vulva (que por sorte não está à venda no anúncio, ao menos por enquanto)?



Além do mais, tremendo mau gosto colocar imagens tão assustadoras numa propaganda de produtos cosméticos, hein? Geralmente colocam lindas e suaves garotas, dessa vez optaram por essa monstruosidade adulterada.

Definitivamente não se fotografa mais mulheres; agora eles as remodelam, mesmo em fotos.

domingo, 3 de janeiro de 2010

Animal planet

Deixa eu desmistificar uma coisa: formigas NÃO são criaturas esforçadas e trabalhadoras, mas simples pragas sanguessugas que adoram morder pobres diabos inocentes como eu. Porque a gente sabe que é tudo lenda o que falam de positivo dessas diabas quando percebe que ao invés de carregar as malditas folhas formigueiro acima elas passam suas férias mordendo tarantinescamente pés alheios e criando terríveis focos de coceira e inchaço vermelho. Morram, por gentileza.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Simbiose

Já faz um tempo percebi como várias pequenas coisas, aparentemente inócuas, ficam marcadas com tinta indelével em nossa memória. Para mim, as coisas da infância, principalmente: a época em que eu ouvia uma meia dúzia de discos dezenas e dezenas de vezes ao longo do ano, gostava de uma mesma quantidade de filmes que também se repetia incessantemente no meu videocassete e lia os mesmos livros muitas e muitas vezes, bem mais que agora, que lamentavelmente estou numa perene lentidão para desbravar novos territórios. Enfim, não foram poucos os momentos em que me peguei no banho cantando nota por nota a música do jogo do Toy story para o Super Nintendo, composta pelo célebre senhor XXX; que percebi ao reler os livros de Lobato que muitas palavras que já estão enraizadas há incontáveis séculos em minha cabeça, como "asneira" e "embolorado", eu retirei de suas incríveis páginas, que já degustava com prazer na meninice; que sabia nos meus filmes queridos (como Abracadabra, As aventuras de Huck Finn e os desenhos da Disney — que, como já deu para perceber, me influenciaram e me influenciam muito) quando tal ou tal personagem entraria em cena, sua mão mexer-se-ia ou a fala seria mal dublada; que nos meus gibis favoritos eu sabia by heart sempre os momentos que mais me agradavam, pois sempre estava voltando às páginas favoritas. É absurdo, talvez, mas descobri que aquilo que para a maior parte das pessoas não tem importância, para outras gentes pode ser algo que redefiniu sua vida de uma maneira imensurável.

Dia desses eu novamente me choquei com essa idéia ao mesmo tempo fascinante e aterradora, quando percebi que nunca me saiu da lembrança a seguinte música do seriado da pequena sereia:



Não sei quem diabos compôs isso, escreveu a letra e quem fez a versão para o português. Olhando agora, até acho uma canção bem fraquinha. Mas isso não importa, porque ela ficou para sempre em meu pensamento, e sempre que ouço a palavra "harmonia" ou alguém falando "você é você" ou "eu sou eu" instintiva e instantaneamente eu recordo dessa melodia, cantarolo. Acho isso inacreditável.

Quem sabe alguém não descobre este blogue por puro acaso e uma das minhas frases, pela maneira, estilo ou contexto em que foi escrita, permaneça para sempre junto ao desconhecido leitor? Que usará os mesmos termos, inconscientemente, a mesma construção, nunca conseguirá escapar.

Da minha parte, sei que com certeza devo mais à pequena sereia que a Villa-Lobos. Nunca o cantarolei no banho, muito menos após mais de dez anos sem ouvi-lo.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Senso

Acabo de retornar de uma viagem a São Vicente. O que tem esse lugar? Excesso e falta. Calor excedente, noção faltante.

O sol abrasa e queima o rosto, curte a pele. Impossível dormir. Os ventiladores caseiros e o ar condicionado do novo shopping não conseguem modificar a sensação de deserto, ambiente quente e seco. Fora o desagradabilíssimo cheiro de maresia, odor de peixe, fragrância que adormece os sentidos e instala a moleza no corpo. A produtividade e o ânimo desabam morosos, despencam num abismo de preguiça e sono nunca satisfeito.

O povo anda como pode, sem se importar como é. Mulheres que fariam as musas boterianas parecerem faquires profissionais, com minúsculos trajes evidenciando suas formas grotescas, seus suores excessivos, sua desproporção. Homens arqueados, vencidos pelo clima, destruídos. Rostos repletos de imperfeições, dentes faltantes, rugas por toda parte. E não parecem ter qualquer vergonha em mostrar suas deficiências físicas. Não sei se deveriam. Mas sei que isso não me agrada. A beleza não é a ausência do feio, mas seu disfarce. Ridicularizar o corpo e sua imagem é um problema originado pelo outro lado da ditadura da beleza: agora é de bom-tom não menosprezar quem tem gordura em abundância, por exemplo. Mas, mais que estética, essa questão é sanitária! É de saúde que falamos. Não é saudável deteriorar o corpo, templo de suas funções orgânicas. Do mesmo modo que é condenável expor a decadência de sua figura em público, a vista de todos, sob o julgamento de quem quer que seja. Viver em sociedade importa concessões.

São Vicente é uma cidade de contrastes, mas todos são obscuros.