terça-feira, 23 de março de 2010

Obrigado

Eu odeio essas pesquisas e estatísticas publicadas na imprensa. Rejeito e desconfio de todas. Só acredito nas tangíveis, como "50% dos presidentes brasileiros portavam bigode no tempo do mandato". OK, perfeito, dá para analisar isso. Mas e coisas como "22% dos paulistanos traem suas namoradas"? Como assim? Perguntaram para todos os paulistanos comprometidos e depois fizeram a contagem? É impossível concluir essas coisas por amostragem — para não dizer que é imbecil. É tendencioso, inconclusivo e inútil. Não sei se rio ou se me desespero quando vejo essas informações sendo levadas a sério, sendo usadas como critério argumentativo, sendo citadas por "especialistas" em exposições. São pesquisas que nada dizem, isso quando não são encomendadas por segmentos políticos para mexer com a credulidade dos sempre letrados cidadãos deste país: se divulgam em épocas eleitoreiras a suposta preferência de algum candidato a cargo de representação, aí é aquela coisa, todo mundo comprará esse dado; quem não tinha candidato acabou de escolher, quem não quer que esse avançadinho ganhe também já escolheu — votará em seu adversário mais "forte" (que também foi definido pelas pesquisas compradas pela mídia).

Prefiro analisar as coisas eu mesmo.

10 comentários:

  1. Foda que tem gente que acredita piamente (existe essa palavra?) nessas coisas, tipo minha mãe. E usa isso e "tá comprovado cientificamente" como argumento quando eu discuto com ela, haha.

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  2. Concordo em parte com você, Filipe. De fato, há muitas pesquisas mal desenhadas e sobre assuntos sem nenhuma importância (talvez a maioria). Mas não se pode afirmar que, se você não tiver feito uma determinada pergunta a todos os paulistanos, você não poderá afirmar nada a respeito de hábitos dos cidadãos, por exemplo. Desde que bem desenhada, a amostragem tem sim valor estatístico e existem testes específicos, como o cálculo amostral que nos dá o número (n) de indivíduos que devem ser analisados levando-se me contra uma estimativa de prevalência de determinado evento na população, etc, etc. Não é algo fácil de se fazer (e nem sempre é feito, principalmente nessas pesquisinhas baratas de folhetins a que você se refere). Mas há pesquisas que podem sim trazer informações muito importantes. Por exemplo: é de grande importância, em termos de saúde pública, saber a porcentagem de adolescentes que usam preservativos em suas relações sexuais. Não há necessidade de se entrevistarem todos os adolescentes do país para se chegar a uma estimativa de número ; questionários bem conduzidos podem nos dar esta informação. E assim por diante.

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  3. Não dá, Sergio, isso não entra na minha cabeça. Tudo bem afirmar, depois de uma pesquisa, que "a maior parte dos paulistas não fez faculdade", isso é uma coisa mensurável; mas nunca vou aceitar um "79% dos brasileiros acham o governo Lula bom ou ótimo", não consigo acreditar nisso de maneira alguma. Mas eu acho sim que há pesquisas importantes, como você bem destacou, e que elas devem ser abordadas mesmo como um cálculo aproximado ou estimado, e não como algo certo e com uma margem de erro irrisória, como se pessoas fossem bichos e analisando dez animais ao acaso você chegasse nas características da espécie toda...

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  4. Mas a amostragem (repito, quando feita corretamente) tem valor real, Filipe. Por isso existem os desvios-padrões e todo resultado de pesquisa traz consigo uma margem de erro, que pode ser maior ou pior, por exemplo, de acordo com o n (número de pessoas, por exemplo) estudado. Obviamente, quando maior o n, menor a margem de erro. Quer uma exemplo banal mas ilustrativo? Imagine uma caixa escura lotada de bolinhas: 750.000 azuis e 250.000 vermelhas. Para você saber a proporção de azuis/vermelhas, você não precisa (acredite! hehe!) avaliar 1 milhão de bolinhas. Obviamente, se você tirar apenas 10, é bem possível que não obtenha 2 ou 3 vermelhas para 7 ou 8 azuis (que é a proporção esperada). Um n=10 é pequeno, portanto, para essa amostragem, trazendo uma margem de erro grande. Mas, se você retirar 1000 bolinhas da caixa, é mais provável que obtenha um número próximo de 750 azuis e 250 vermelhas. Não será exato e é aí que entra o valor da margem de erro. Mas você terá sim informação fidedigna sobre a proporção de azuis e vermelhas naquela caixa. Assim funcionam (ou deveriam funcionar) os estudos por amostragem.

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  5. Acho que o exemplo mostra como as coisas dependem da "sorte": seria possível (mas não tão provável, vá lá) que você só tirasse 10.000 bolinhas vermelhas, por um acaso muito estranho; e aí o que concluir? Que só há bolas vermelhas na caixa? Que elas são a maioria, caso haja outras? etc.

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  6. Não, Filipe, isso não é sorte. É a lei das probabilidades. Quando se faz um estudo, existe o que se chama de nível de significância (valor de p). Você estabelece o nível de significância que quer adotar para o seu estudo. Exemplo: para um p<0,05, considera-se que a diferença observada é real com mais de 95% de certeza. Para cálculos como o das bolinhas, existe o desvio padrão e o chamado intervalo de confiança. Você é bem inteligente ao ponto de SABER que a possibilidade de você retirar 10.000 bolinhas vermelhas tende a zero. Não me diga que não seria "tão provável". É virtualmente impossível que isso ocorra. A estatística se baseia fundamentalmente em probabilidades. E isso tem valor, não há como negar. Veja as pesquisas em épocas de eleição. Claro que elas erram, mas acertam na maioria das vezes. Candidato X tem 38% das intenções de voto segundo a pesquisa. Após a apuração, ele teve 41,6%. Grande erro? Claro que não. Você jamais verá uma pesquisa dizer que o candidato tem 38% das intenções de voto e, após a apuração, ele aparecer com 7 ou 70% - embora isso fosse teoricamente "possível", já que se entrevistaram poucos milhares e não todos os milhões de eleitores.

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  7. Sergio, existe um filme do Manoel de Oliveira chamado O improvável não é impossível. Eu concordo plenamente. Sei que a probabilidade tende a zero, mas não é impossível. Pode ser virtualmente impossível, mas isso não deixa de ser uma projeção, e poderia muito bem ocorrer de, após chacoalharem a caixa, as bolinhas vermelhas ficarem em grande quantidade por cima. Continuo não conseguindo extrair qualquer conclusão desse tipo de coisa.

    Com relação às pesquisas e projeções eleitoreiras, são as de que mais desconfio. Sei que o resultado acaba saindo parecido, mas para mim há uma grande manipulação nisso tudo. Eu tenho esse lado "duvidador", São Tomé...

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  8. Hahahaha! Mas que sujeito mais desconfiado!
    O seu argumento sobre as bolinhas vermelhas por cima também tem um nome em estatística: bias ou vício. No caso, configuraria um vício de seleção, ou seja, a amostra foi obtida de forma inadequada o que invalidaria as conclusões. E você está certo: são projeções, mas que refletem a frequência aproximada, com margens de erro variadas, de determinado evento em uma população. Não precisa ser tão desconfiado. Claro, não deve levar a sério pesquisas da revista Capricho sobre a porcentagem de adolescentes que baixaram da internet músicas do último CD da Lady Gaga. Mas seja razoável: há vários estudos que nos fornecem informações fidedignas.
    Mas não vou mais ficar aqui te amolando com isso. Sei que, por mais teimoso que seja, vai pensar na caixa de bolinhas quando vir uma nova pesquisa daqui pra frente, hehe.

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  9. Hahaha! Ball fields forever. Mas é aquilo: eu só duvido dessas pesquisas, mas não que elas de fato não funcionem. E, claro, há aquelas mais críveis, a gente já aprendeu a filtrar.

    Como diz o velho deitado, ops, ditado: "Confie desconfiando".

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