segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Incitatus

O genial Adão Iturrusgarai — um dos cada vez mais raros "tiristas" consagrados que não se acomodaram na experimentalismo egoísta (como Angeli), na repetição ofensiva (como Glauco) ou na metafísica estapafúrdia (como Laerte) — publicou no cada vez mais bobo Folhateen, alguns meses atrás, um quadrinho na página final do caderno em que fazia pouco de várias convenções sociais e de relações, com seu habitualmente brilhante senso de humor. Pois bem, não é que os leitores tão letrados do maior jornal do país não conseguiram entender que era uma piada? Choveram insultos, xingos e absurdos nas mais variadas formas. Por várias semanas. Adão teve que se defender expressamente, pois a incompreensão era violenta e não dava sinais de acabar; disse que é sua função fazer comédia das pequenas coisas da vida, que esperava que todos compreendessem os limites da zombaria. Muito bem. Acontece que semana passada ele publicou novo trabalho polêmico no mesmo caderno, uma análise ácida sobre as desvantagens do casamento. Para não ser incomodado, Adão escreveu, já com a ironia que é obrigatória no trato com essas pessoas, que se tratava de uma obra de ficção e humor. E não deu outra, claro: mais reclamações e impropérios, publicados hoje. A análise das duas últimas cartas a seguir é clara e triste: as pessoas envelhecem mal, sem sensatez e sabedoria, apenas envelhecendo o corpo detentor de um espírito já de há muito velho, velhíssimo.

VALEU, ADÃO!
"Excelente a charge do Adão ["Humor", ed. 15/2]. Pena que o humorista tenha que frisar em sua obra de arte que se trata de um texto de humor, devido a pessoas sem senso de humor. E, o pior de tudo, apesar de sátira, o que ele diz é verdade: os jovens fazem sexo antes do casamento, casais vivem infelizes e por aí vai. O "cara" é o Adão, e não o Lula. E sobre o leitor Breno Correa, que criticou o Álvaro Pereira na edição anterior, faço o papel de advogado do diabo: quantas vezes uma música boa à primeira ouvida não se torna repetitiva?"
Mateus Luiz de Souza, 19, São Paulo

FORA, ADÃO!
"O sr. Adão voltou à carga com seu humor azedo. Tanto que precisa avisar que é humor, porque sabe que não é. Projeção de fracasso em construir a vida? Esse menoscabo do casamento é desconhecer a realidade. O vazio dos que frequentam barzinhos e as frustrações do sexo-descarrego estão levando as pessoas à depressão e à perda do sentido de viver. Construir uma família, crescer no amor e no aperfeiçoamento humano, enfim, dar sentido à vida é algo que o mau humor do texto crassamente ignora."
Durval Checchinato, 73, Campinas, SP

FORA, ADÃO 2
"Lamentamos o infeliz humor repassado às nossas crianças publicado no Folhateen de 15/2. O texto citado não contribui em nada para o futuro melhor, uma vez que deixa os jovens, ainda em formação, confusos e estimulados para um desregramento e desrespeito à instituição do casamento. Não há dúvida alguma de que a desestruturação familiar é a grande causa da violência que vivemos. Sem dúvida o texto induz a criança a ver o casamento como algo pequeno, feio e sem sentido para os dias atuais."
Delvani Alves Leme, 57, Curitiba

Pois é preciso que os jovens como Mateus destruam esses cancerígenos preconceitos contra toda forma de inconformismo e humor. Que acabe essa mentalidade grotesca de levar tudo a ferro e fogo. Porque foi gente assim que consagrou a Suetônio, um fofoqueiro de marca maior, o título de maior biógrafo dos Césares, e daí vieram absurdas crenças como a de que Calígula nomeou seu cavalo cônsul — ridículo imaginar sequer que isso não seja uma piada política qualquer, como as que hoje o Millôr Fernandes faz a todo instante —, Vitélio roubou comida dos templos dos sacerdotes e outras palhaçadas que pessoas como esses dois revoltados senhores que escreveram à Folha acreditam, pois já deixaram de rir há décadas.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

TV aberta, cabeça fechada

Impressionante como a televisão aberta não tem limites para a ruindade. Vejamos, programas escolhidos ao acaso e em emissoras diferentes:

1) Malhação (Globo) - Acho que nem protozoários deficientes mentais da Idade Média eram tão mongolóides e obtusos quanto os adolescentes trintões dessa pequena novela. Humor rasteiro, abjeto, sonoplastia e trilha ridículas, atuações por vezes muito constrangedoras, drama formulaico (da pior fórmula possível), tentativas torpes de conscientizar os adolescentes com temas polemizados pela própria TV Globo, filmagem mais amadora que vídeo de festa de casamento, maquiagem ruim, iluminação precária que queima os pescoços dos intérpretes, tudo é um desastre, dos figurinos à edição preguiçosa. Um mar de lama juvenil, em suma.

2) Programa do Ratinho (SBT) - Esse detestável senhor foi um dos responsáveis pela popularização dos programas escatológicos que exploram de maneira vil os terrores de pessoas destruídas pela vida, deformadas, pobres e desesperados em geral. O mais ridículo é que ele se promove e é vendido como uma espécie de justiceiro, de defensor dos direitos de gente humilde. Programa execrável e apelativo, de perder mesmo a fé na raça humana.

3) TV Fama (Rede TV!) - O que dizer de um programa extremamente tosco tecnicamente que vive de comentar assuntos de outras redes de televisão — notavelmente a Globo e suas novelecas —? Isso já é constrangedor por si só, mas botar um monte de pseudo-apresentadores comentando risivelmente notícias da relevância de "Latino vai ao mercado" consegue ser ainda mais deprimente.

4) Show da fé (Bandeirantes) - Outro programa comandado por RR Soares; sem comentários.

Mais uma vez passo por elitista e esnobe, mas: viva a TV Cultura! Uma emissora que passa Doug, programas musicais, documentários e filmes legendados, especiais de todo o tipo e ainda não abusa da cretinice nem nos jornais que apresenta, merece um mínimo de respeito.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Mais do mesmo

Como na vida nada realmente termina (exceto, talvez, a própria vida), eis-me aqui complementando posts anteriores.

- 15/01/10 (sobre TGI): minha professora orientadora simplesmente "se escafedeu-se". Largou as orientações sem mais (e nem meio mas), sem avisar, claro — a delícia de descobrir algo por um comunicado afixado de qualquer jeito num mural de avisos entre outras 583 notícias fresquinhas!... —, não responde meus e-mails e não corrigiu meu trabalho, falou o que devia mudar, analisou eventuais problemas, deu o aval ou mesmo se dignou a ler o diabo. A nova orientadora, designada com muita graça e encanto pela própria faculdade, é uma simpática desconhecida que nunca vi mais gorda — ou quem sabe mais magra? — e que portanto não acompanhou a evolução do projeto e nem sabe qualquer coisa sobre mim ou meu trabalho. Uma alegria isso, e mais gratificante ainda é cogitar as mudanças na banca examinadora e nos critérios de avaliação, justo no meu último semestre na desgraçada faculdade. Cada vez adoro mais aquele lugar.

- 14/02/10 (sobre cinemas comerciais): acabei nem comentando um dos principais problemas desses lugares, que é o ódio a quem fica nas salas para ver os créditos finais dos filmes. Olha, eu paguei o ingresso, eu estou sentado, eu tenho todo o direito de ver o filme até o fim! Mas claro que isso irrita os sempre irritáveis funcionários dos cinemas comerciais. As táticas para me expulsar da sala — eu, que sempre sou o último a sair — costumam ser: acender escandalosamente as luzes da sala; andar pelas fileiras, atrapalhando minha visão, com o pretexto de ver se não deixaram algo nas fileiras, embaixo dos bancos etc. (o que é obviamente uma desculpa, já que o chão e as cadeiras vivem imundos); começar a falar bem alto com outro funcionário/atendente (geralmente sobre futebol, parece até que adivinham); fazer cara feia e se plantar na minha frente na sala, perto da tela; cortar os créditos antes do fim. Maldição, o filme tem música, tem esclarecimentos técnicos e de equipe, tem finais alternativos, ou simplesmente não tem nada, eu quero e posso vê-lo até o fim. Não tenho culpa se os filmes agora passam todos os créditos no fim e demora cinco minutos para esgotá-los. Que vão reclamar com quem os fez, ora. Mas do momento que estão ali, quero assistir a eles também, não vê-los seria como ignorar a orelha de um livro, ou seja, não ler o livro em sua integralidade. Esse é talvez o pior e mais comum defeito dos cinemas comerciais, e já fui vítima desses abusos em praticamente todo cinema comercial que freqüentei. A última vez que me ocorreu isso foi precisamente ontem. E quando acabou o filme e eu já me dirigia à escada para sair do andar, a funcionária do cinema gritou, para um público que esperava do lado de fora, não sei se para incitá-los contra mim ou como uma mesquinha forma de se aliviar: "JÁ PODE ENTRAR NA SALA QUATRO".

Há cada vez mais pessoas no mundo, mas cada vez menos gente.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Projetor

Desonestidades dos cinemas comerciais:

- Exibir filmes em suportes diferentes dos originais. A fita branca, de Michael Haneke, foi filmado em 35 mm e nos cinemas comerciais de São Paulo a exibição está sendo em projeção digital. Isso é um absurdo, agravado pelo fato de que a exibição nessa desgraça de suporte não diminuiu nenhum custo para o espectador, já que o preço do ingresso continua rigorosamente o mesmo.

- Trailers em cineclubes. Já comentei isso aqui, mas não entrei em detalhes: o principal problema sem dúvida é que os trailers são de filmes exibidos comercialmente no cinema, e não da programação alternativa dos tais cineclubes. A bem da verdade, não sei se isso acontece em outro cinema que não o HSBC Belas Artes, mas é sem dúvidas algo patético.

- Cortes nos filmes. Não fui ver Brüno por essa razão, li no jornal que cortaram uma ou duas cenas do filme por não sei qual razão. O papo é sempre o mesmo: "as cenas excluídas são secundárias e não comprometem o entendimento da história", BULLSHIT! Todas as cenas de um filme pronto e montado são necessárias a ele, e não cabe a distribuidores estúpidos censurá-las.

- DVDs sendo exibidos em cineclubes pelo mesmo preço dos outros filmes. Que palhaçada é essa? Qual o custo de se alugar/baixar/copiar um DVD? Que história é essa de repassar ao espectador o valor normal de um ingresso? As exibições de filmes em DVD nos cineclubes devem evidentemente ser de graça — o que costuma acontecer, é verdade, mas já vi ocorrer diferente num filme de Jacques Tati no HSBC.

Mas sem dúvida a coisa que mais me irrita: incentivar o consumo da maldita e pestilenta e barulhenta e pavorosa e irritante e horrenda pipoca nas sala de exibição. Viva a Cinemateca!

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Tudo que você nunca quis saber sobre sexo mas teve azar de escutar

Muitas vezes me taxam de pudico, antiquado, retrógrado, hipócrita, membro da Associação das Senhoras Católicas, mas real e sinceramente tenho pavor de um certo tipo de vulgaridade que a cada dia costuma aparecer com maior freqüência em nossa sociedade. Darei dois exemplos:

1) Sexo no BBB. Eu não assisto a esse programa, mas claro que como a maior parte dos assuntos da Globo somos forçados a nos inteirar mesmo sem o desejar: todos nossos amigos comentam, é manchete nos principais sites de notícia — outro problema grave dos tempos modernos, há muito para se noticiar e muito pouco que importa —, os sites de humor todos fazem sátiras etc. Não estou querendo me eximir como detentor de bom gosto, não tenho vergonha em assumir algumas duvidosas preferências culturais que possuo, é só talvez para me eximir de uma possível ignorância sobre a completa situação do "problema": a tal moça com nome de ilha grega que praticou sexo oral (e naturalmente o tal sujeito que o recebeu) em pleno confinamento na casa global. Honestamente, nada contra essa prática sexual, longe de mim querer definir o que um casal deve experimentar na hora de suas intimidades físicas. A única coisa que me incomoda é essa noção de gratuidade que isso representa: mal conhecer a pessoa e já entregar seu corpo a ela. Imagino os pais dessa garota (os pais do rapaz provavelmente nem irão ligar) vendo a filha sugando o falo de um desconhecido após poucos dias de contato com ele e, pior, em rede nacional. Para todo mundo ver. Dividir sua privacidade com câmeras e espectadores dispostos a aclamar qualquer baixaria. Não está comprovado que os tais participantes do programa de fato fizeram sexo, mas se o fizeram fica o meu inócuo lamento por essa cultura do oba-oba que com freqüência cada vez mais assombrosa se instala nas relações afetivas/amorosas/sentimentais, "não há nada de mais em transar no primeiro encontro", essa descartabilidade de corpos que, sob o pretexto de contemporaneizar as relações acaba por dizimar qualquer resto de real comprometimento. Esse tipo de ação catalisa ainda mais a transformação das pessoas em objetos.

2) Roberto Carlos. O "Rei" disse que a segunda melhor coisa da vida é sexo, a melhor é sexo com amor e a terceira, sorvete. Não sei por que ele se lembrou do sorvete no meio de tantas recordações sexuais (Freud saberia), mas é o caso clássico da pergunta: e eu com isso? Por que agora se importam tanto com as preferências sexuais de desconhecidos, de artistas, de gente na rua? De que interessa saber se a Mariazinha da esquina é lésbica, se o Zelão da portaria não usa seu ânus só para evacuar seus excrementos, se o Tonho gosta de praticar sexo com vendas e algemas? Por que atores dão entrevistas sobre suas experiências na cama?

Francamente.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Começo do fim

Hoje recomeçaram minhas aulas. Último semestre do curso, mas a mesma sensação desoladora de sempre: que não sou de lá, que não conheço ninguém, que não me encaixo. Que é o primeiro semestre do resto da minha vida, que não sei o que fazer, que detesto cada segundo lá, que desperdiço minha juventude sentado num lugar que me despreza e ao qual não faço questão de retornar. Que ninguém pensa o que penso, sente o que sinto, lê o que leio, vive o que eu vivo. Que eu estou cada vez mais sozinho, mais cansado, com sono, chateado, apagado. Que não sei o que fazer depois e me arrependo do que faço agora.

Que, enfim, nada mudou.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Alegoria

E está começando o Carnaval! Uma época grandiosa em que convivemos com o melhor da natureza humana: mulheres musculosas e bronzeadas artificialmente (com aquela cor de frango de máquina) exibindo sem pudor seus traços vulgares, a vulva mal coberta por um pedaço minúsculo de pano lantejoulado; os "sambistas" sempre criativos, com seus maravilhosos samba-enredos, cada um mais diferente do outro mas de estranha sonoridade equivalente, letras que sempre evocam Cabral e as caravelas, as vozes dos cantores sem nenhuma mudança (será sempre o mesmo sujeito cantando?); as fantasias tão caras e tão vistosas, incrivelmente parecidas, sempre algo com plumas, penas, purpurinas, e quem as veste suando como um porco (também pela vontade de "sambar", que significa requebrar-se como um possuído); os enormes carros alegóricos, sempre com dragões, estátuas de entidades do candomblé ou algum homenageado canhestramente retratado; poderia falar também do barulho, da gritaria, da algazarra, da imbecilidade, do caos, da sujeira, e, at last but not at least, da fonte dessa renda gigantesca jogada no lixo em poucos dias — o tráfico.

E o Brasil se orgulha de ser conhecido como o país do Carnaval. Uma festa nojenta, abominável, que torna todas as mulheres prostitutas e todos os homens vagabundos, uma grande orgia coletiva que estraçalha o bom gosto e a paz nas ruas, um acontecimento, em suma, lamentável.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Uma descoberta e uma constatação (em sons)

Descoberta: Ronnie Von fez discos primorosos décadas atrás! Quem vê aquele senhor educado e vaidoso apresentando comportados programas televisivos não imagina que nos anos 60 ele fez coisas revolucionárias e psicodélicas no Brasil, talvez bem mais à frente do seu tempo do que por exemplo a Tropicália, que é da mesma época. Ouçam "A incrível luta do reino de Parassempre contra o império de Nuncamais" e descubram essa pérola ainda obscura do pop rock nacional. Espero que relancem os álbuns dele em edições de luxo, porque não são de apenas guardar MP3 ou disputar LPs a preços exorbitantes com colecionadores gananciosos.

Constatação: brasileiros não entendem música sem letra. Para eles a letra é tudo, ou a principal parte de uma canção, e a música instrumental no Brasil sobrevive marginalmente. Quais as músicas de maior sucesso do Queen por aqui? "Somebody to love", "Love of my life", "Crazy little thing called love" etc. Falar de "amor" é lindo, mas claro que o importante para essas pessoas é a letra/título da canção, já que o Queen está bem longe de ter apenas três ou quatro composições primorosas. Será que se "Death on two legs" tivesse "love" no título ela seria uma das mais citadas e tocadas nas rádios? Eu não tenho a menor dúvida. Isso é preguiça, é querer receber "mensagens" de uma obra de arte, é querer sensações imediatas, é desistir de sentir em prol de afirmar. Letras deveriam ser paulatinamente extintas das canções populares, como os diálogos vêm sendo suprimidos nos romances contemporâneos. É a única maneira de fazer as pessoas entenderem que música são sons, harmonia, ritmo, melodia, e não palavras, frases, explicações, poesias.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Pirlimpimpim

Ontem revisitei o Sítio do Picapau Amarelo em Taubaté, foi muito divertido e emocionante rever os personagens que nunca saíram da minha memória e das minhas leituras. Mas o que achei mais curioso foram os nomes das ruas ao redor da chácara: Rua Visconde de Sabugosa, Rua Emília, Rua Pedrinho, Rua Príncipe Escamado!... Achei maravilhoso, imagino alguém pedindo informações em Taubaté: "Por favor, onde fica a Rua Príncipe Escamado?" e recebendo de resposta "Fica logo atrás da Rua Marquês de Rabicó, perto da Rua Urupês, próxima à Rua Nastácia". E quanta gente que mora lá nem sabe quem é o bendito príncipe monarca do Reino das Águas Claras?

Gostaria de saber como vivem as pessoas nessas cidades que são berço de alguma personalidade muito relevante e que possuem um símbolo turístico muito forte. As placas de sinalização nas ruas têm os personagens de Lobato! Não consigo deixar de sorrir imaginando alguém passando em frente a esse lugar todo dia para ir trabalhar.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Toca

E não é que aparentemente conseguiram uma entrevista com Bill Watterson, o autor daquela que para mim é a melhor tira de todos os tempos? Desde que, criança, li Os dez anos de Calvin e Haroldo, considerei esse quadrinhista um dos homens mais inteligentes que eu conhecera. As sucessivas, sistemáticas e recorrentes leituras e releituras de Calvin e Haroldo só fizeram essa minha impressão se firmar e crescer. Ainda hoje, lendo as tiras no original (Calvin & Hobbes!) e em ordem cronológica, continuo com a mesma perplexidade diante desse homem tão peculiar e recluso, que interrompeu sua criação no momento de maior popularidade por simples consciência de artista, um pudor cada vez mais inexplicável nos dias de hoje. Um homem fora de sua época, que não permitiu qualquer comercialização com seus personagens, exceto livros de reunião das tiras diárias e semanais. Um homem que fez a tira mais doce e profunda, mais bonita e engraçada, a mais importante da minha vida.

A entrevista aqui.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Enganam-se

Já me chateei mais com a vida. Hoje eu me considero mais sereno de maneira geral, e mais sábio também.

Em casa, por exemplo, sei que não terei a valorização que acredito merecer. Não me dou bem com meus irmãos, por exemplo, que me consideram um vagabundo desocupado que não se interessa por direito e que não quer fazer nada da vida. Talvez eles tenham razão, para eles. Mas sei que isso me machucava antes, agora tento relevar e muitas vezes consigo. Se eles me têm em um baixo nível, bem, problema deles. Isso não muda nada em mim. Que não respeitem meus valores, que riam dos meus problemas, que ignorem minhas tristezas e que desconsiderem minhas alegrias, tudo isso é pra mim uma simples decorrência de um "desencaixe" que existe na minha vida. Não falo com rancor ou desespero, sei que as pessoas infelizmente são assim, mas isso só evidencia que pertenço a outro mundo que não o deles, outra realidade que algumas pessoas subestimam.

Então agora se acham que eu sou um inútil que passa o dia todo lendo gibis, livros idiotas ou indo ao cinema ou ficando na internet, bem, não me esforçarei para mudar o que eles pensam, essa idéia que têm de mim. Não me interessa falar que o tempo que fico no computador também estou trabalhando no meu TCC da faculdade — que já está quase no fim, aleluia! —, não me interessa desmentir a apreciação que fazem de mim e que considero injusta. Não quero dividir minha vida com eles, não acho que eles sejam meus amigos no sentido que entendo a "amizade", não penso ser bom para mim modificar minha vida com base no que eles falam que está errado com ela.

Minha irmã já achou este blogue, sem eu ter sequer comentado com ela, e entendeu tudo errado o que disse em uma ocasião. Sei que ela lerá isto, e que entenderá errado de novo o que eu quis dizer — talvez eu não saiba mesmo me expressar —, que contará à minha mãe e a alarmará por algo que para mim é inócuo e que existiria mesmo sem eu escrever isto, mas nada disso me emociona mais muito. Sinto-me estranho em casa.

Um dia, quem sabe, conviverei apenas com quem me tem em boa estima. O que sei é que já não me interessa mais muito o que os outros acham de mim, contanto que eu esteja satisfeito comigo.

P.S.: As malditas formigas voltaram, junto com um calor infernal.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Nação

Desde pequeno fui inconscientemente instruído a olhar com certa desconfiança para aqueles vendedores orientais de bugigangas, aparatos eletrônicos e quinquilharias em geral. Verdade é que às vezes o receio é desconfiado, há entre eles vários embusteiros e pilantras, que só se interessam pelo seu dinheiro (talvez também por sua irritação); mas há gente ruim em todas as etnias, não dá mais pra duvidar disso.

O que só parei para pensar outro dia é como alguns desses vendedores levam uma vida triste. A maioria vem do Oriente sabe-se lá por que razão, provavelmente esperando melhorar de vida e ter mais oportunidades, e permanecem aqui isolados, muitas vezes segregados em pequenas comunidades que procuram imitar seu local de origem, e quase nunca falam português fluentemente.

Aqui perto da minha casa tem um pequeno shopping, espécie de galeria estendida, e num dos estandes próximo ao ianquíssimo McDonald's há um vendedor oriental, creio eu que chinês ou coreano. Ele sempre está com cara meio amarga, vendo sozinho um filme de sua terra ou com legendas escritas em sua língua. Quanta história esse sujeito não terá deixado para trás? Quais serão suas raízes e os motivos que o fizeram deixar a pátria? Será que ele não gostou do Brasil e prefere permanecer como numa embaixada de seu país, mantendo todas as suas tradições e hábitos, não querendo conhecer a cultura brasileira e nem ao menos desejando se expressar no idioma do país que ora habita? Não é triste perceber como ele quer viver outra realidade? E constatar que ele possivelmente nunca retornará à sua terra natal?

Por isso cada vez mais admiro esta frase de Alejandro Jodorowsky, quando indagado por que se estabeleceu na França: "eu não moro em Paris, eu moro em mim mesmo". Também dele: "A pátria de um homem são seus sapatos". A felicidade de um homem não está condicionada ao seu país, mas a seu espírito.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

O preço a se pagar

Meu irmão gosta muito de videogames, tem vários tipos e jogos. Ele peneira as promoções, compra de revendedores de confiança que fazem uma oferta boa etc.

Já eu tenho pavor só de imaginar o preço de UM desses jogos. Sou extremamente cauteloso com o que gasto; não por comprar poucas coisas, mas precisamente pelo contrário.

Ultimamente só tenho comprado coisas que considero essenciais pra mim: livros (principalmente pockets franceses, pelos quais pago com prazer aquele valor por volta de 20 reais), que me recuso a ler no computador; ingressos de cinema para poucos filmes selecionados; revistas e gibis; alguns pouquíssimos discos e DVDs.

Ainda não tenho um trabalho que me garanta independência financeira dos meus pais, mas não acho que dou muitos gastos. Não freqüento baladas, clubes, associações ou estabelecimentos caros, dificilmente gasto em roupas e alimentação, e o que gasto é quase tudo em leitura mesmo, fora luz e água. Não me considero esbanjador, não ligaria se meu filho gastasse meu dinheiro nas mesmas coisas que gasto o dos meus pais.

Mas ainda assim lamento bastante gastar um dinheiro que não é meu. Fora a faculdade, que é um roubo à mão armada — e o resultado dessa orgia educacional também é um crime.