sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Senso

Acabo de retornar de uma viagem a São Vicente. O que tem esse lugar? Excesso e falta. Calor excedente, noção faltante.

O sol abrasa e queima o rosto, curte a pele. Impossível dormir. Os ventiladores caseiros e o ar condicionado do novo shopping não conseguem modificar a sensação de deserto, ambiente quente e seco. Fora o desagradabilíssimo cheiro de maresia, odor de peixe, fragrância que adormece os sentidos e instala a moleza no corpo. A produtividade e o ânimo desabam morosos, despencam num abismo de preguiça e sono nunca satisfeito.

O povo anda como pode, sem se importar como é. Mulheres que fariam as musas boterianas parecerem faquires profissionais, com minúsculos trajes evidenciando suas formas grotescas, seus suores excessivos, sua desproporção. Homens arqueados, vencidos pelo clima, destruídos. Rostos repletos de imperfeições, dentes faltantes, rugas por toda parte. E não parecem ter qualquer vergonha em mostrar suas deficiências físicas. Não sei se deveriam. Mas sei que isso não me agrada. A beleza não é a ausência do feio, mas seu disfarce. Ridicularizar o corpo e sua imagem é um problema originado pelo outro lado da ditadura da beleza: agora é de bom-tom não menosprezar quem tem gordura em abundância, por exemplo. Mas, mais que estética, essa questão é sanitária! É de saúde que falamos. Não é saudável deteriorar o corpo, templo de suas funções orgânicas. Do mesmo modo que é condenável expor a decadência de sua figura em público, a vista de todos, sob o julgamento de quem quer que seja. Viver em sociedade importa concessões.

São Vicente é uma cidade de contrastes, mas todos são obscuros.

2 comentários:

  1. gosto quando você se dá a liberdade de escrever sobre essa coisa cotidiana-crônica livre ou coisa parecida. quase sempre sai coisa legal ou bonita. Florianópolis é bem assim no verão. mata a cidade.

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  2. Obrigado! É isso que quero neste blog, "espairecer".

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